Fonte: Valor Online
O próximo presidente da República terá de enfrentar grandes desafios no setor de petróleo e gás. As incertezas em relação ao futuro da política de preços da Petrobras, do índice de conteúdo local, dos leilões do pré-sal preocupam especialistas, que consideram que o segmento de energia deveria ter propostas mais aprofundadas nas campanhas eleitorais.
A Arena Valor do Conhecimento, evento paralelo à Rio Oil & Gas, realizado na semana passada, convidou especialistas do setor de energia para uma avaliação das plataformas dos presidenciáveis no segmento de petróleo e gás. Para o professor Edmar de Almeida, do Grupo de Economia da Energia (GEE) do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o programa liberal de Jair Bolsonaro (PSL) parece ser um dos que se aproxima das políticas adotadas no setor pelo governo Temer, representando, assim, "um certo continuísmo, mas com um liberalismo mais cru, sem agenda de sofisticação".
Ele acredita, porém, que posições radicais, como a privatização da Petrobras - defendida pelo candidato, que depois recuou da ideia -, teriam dificuldade de ir adiante no momento de alinhar uma coalisão política.
Já a proposta de Fernando Haddad (PT), segundo Almeida, indica "grande mudança em relação ao que se tem hoje, com possível controle político e social da Petrobras e sua utilização como instrumento de desenvolvimento e de política de preço". Ainda assim, o professor da UFRJ avalia que não há espaço prático nem político para se fazer alterações muito radicais. "A Petrobras ainda deve US$ 80 bilhões, tem baixa capacidade de investimento e não pode aumentar seu endividamento", diz ele.
Para o especialista do GEE, as agendas de petróleo e gás de Marina Silva (Rede) e de Geraldo Alckmin (PSDB) são bastante convergentes entre si, e também representam, em vários aspectos, continuidade. Quanto à proposta de Ciro Gomes (PDT), Almeida considera ter pontos "disruptivos" que poderiam gerar traumas no setor," como a ideia defendida pelo candidato de expropriação de contratos de exploração de campos de petróleo que foram vendidos no governo Temer". Almeida ressalta, no entanto, que a medida teria de passar pelo crivo do Congresso. Ele não vê espaço para "aprovação de coisas muito mirabolantes".
O painel contou ainda com a participação do diretor- geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Décio Oddone, e do consultor de empresas e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), Jorge Camargo. Eles defendem a política de investimentos no pré-sal, a realização do calendário de leilões e a liberalização do mercado de combustíveis. "A transparência e a competição são alternativas para dar legitimidade aos preços diante da sociedade", diz Oddone.
A ANP já trabalha nas próximas rodadas de leilões para 2019, independente de quem será eleito novo presidente: "O pré-sal é extraordinário, uma janela de oportunidade de geração de riqueza que não pode ser desperdiçada ", afirma o diretor-geral da ANP, frisando que o país deixou de ganhar mais de R$ 1 trilhão a partir da suspensão dos leilões, em 2007. "O atraso na exploração do pré-sal, na década passada, representou a oportunidade perdida de uma geração no Brasil. Deixamos de receber investimentos da ordem de R$ 600 bilhões entre 2008 e 2013 e deixamos de arrecadar outros R$ 600 bilhões entre 2013 e 2017", calcula ele.
Numa espécie de recado ao futuro novo governante, Odonne diz que é preciso superar o trauma ideológico e adotar postura muito mais pragmática. "Continuamos tratando o petróleo como aquele bem estratégico, como na época da Guerra Fria, como se nada tivesse mudando". Segundo ele, "o petróleo caminha para a obsolescência. Ou somos capazes de usar esse recurso enquanto tem valor ou vamos perder de novo essa oportunidade".
Já para Camargo, existem dois tipos de propostas de campanha presidencial: "As que favorecem e as que não favorecem o investimento privado". Entre essas últimas, estariam, segundo ele, parar os leilões e impedir mudanças nas regras de conteúdo local. "Mas uma coisa é fazer campanha, outra é ser governo" pondera ele, acreditando que "qualquer administração minimamente pragmática vai ouvir o setor sobre como se faz para realizar esses investimentos, que têm potencial de R$ 2,5 trilhões em dez anos".