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Produtores privados e estrangeiros vão adicionar 900 mil barris dia na sua produção no país até 2025
Enquanto a Petrobras prevê manter estável a curva de produção de petróleo da empresa a partir de 2022, o volume produzido pelas demais petroleiras, no Brasil, deve mais que dobrar nos próximos anos. O programa de venda de ativos da estatal e os novos projetos do pré-sal têm capacidade para incorporar, até 2025, pelo menos mais de 900 mil barris diários ao portfólio de um grupo bastante heterogêneo que inclui desde pequenos produtores nacionais às grandes multinacionais e que produz, hoje, cerca de 780 mil barris/dia.
Equinor, ExxonMobil, Petrogal, Shell, Total, além das chinesas CNOOC e CNPC, são algumas das companhias que devem fortalecer presenças no Brasil, nos próximos cinco anos. Atualmente, a estatal representa 74% de todo o volume de petróleo produzido no país, de acordo com dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP). Como a petroleira brasileira pretende manter a produção estável, a tendência é que a companhia perca participação de mercado.
Equinor, ExxonMobil, Petrogal, Shell, Total, CNOOC e CNPC estão entre as empresas que vão crescer no Brasil
Segundo o Plano Decenal de Energia (PDE) 2030, da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o Brasil deve atingir em 2025 uma produção média de 3,9 milhões de barris diários de petróleo. A previsão da Petrobras é produzir entre 2022 e 2025 cerca de 2,3 milhões de barris/dia, volume equivalente a 59% da produção nacional estimada pela EPE. Os números do PDE, contudo, tomam como base o plano 2019-2024 da petroleira, com cronogramas desatualizados para as novas plataformas.
O crescimento da produção não-Petrobras deve trazer mudanças estruturais para o mercado. Um dos principais impactos deve ser sentido no refino, segmento em que a estatal está vendendo metade da capacidade instalada. A própria companhia admite que, com o processo de abertura do setor, perderá fatia do mercado doméstico para outros produtores e terá que aumentar exportações de óleo bruto.
A companhia estima que vai vender, no exterior, em média, 891 mil barris diários da commodity entre 2021-2025, o que representa uma alta de 19,6% em relação à média de 2020 e o dobro da média de 2015-2019. As vendas para o mercado doméstico devem cair 7%, para 1,252 milhão de barris ao dia na média entre 2021-2025, ante o volume médio dos últimos cinco anos. A empresa assumiu, em suas projeções, que os novos refinadores privados passarão a trabalhar com outras fontes de suprimento e que as demais petroleiras presentes no Brasil serão concorrentes pelo mercado interno.
O secretário-executivo da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo (Abpip), Anabal Santos Jr, destaca que os desinvestimentos mudarão por completo as relações comerciais atuais. Ele lembra que os pequenos produtores, potenciais compradores dos campos maduros em terra, vendem todas as suas produções hoje para as refinarias da Petrobras, mas que a partir do momento em que a estatal sair do refino na região Nordeste, as empresas passarão a negociar com múltiplos agentes privados com estratégias comerciais diferentes. Mas destaca que ainda há incertezas.
“Que infraestrutura os produtores independentes vão usar? Hoje, essa infraestrutura [de escoamento do petróleo de campos terrestres até as refinarias] é toda da mesma empresa [Petrobras]. Agora os novos operadores desses campos podem ter que buscar acesso a dutos e negociar contrato [com diferentes refinadores], explicou. “Mas estou confiante de que haverá uma revolução fantástica no mercado brasileiro de óleo e gás. Na medida em que novos operadores assumem esses campos maduros e comecem a investir na recuperação deles, isso terá um efeito multiplicador nas economias regionais”, complementou.
O diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, acredita que os desinvestimentos da Petrobras em campos terrestres podem trazer uma nova dinâmica para a abertura do mercado de gás natural. “Acredito que as empresas vão começar a investir mais nesses campos e vamos ter um crescimento da produção de gás onshore, que é um gás mais barato. Isso traz chances para que o modelo de negócios da Eneva [de usar o seu gás em terra para geração de energia] seja replicado”, disse.
A Petrobras, que responde por 86% da oferta de gás no mercado nacional, espera reduzir essa participação até 2025 para algo entre 50% e 55%. Há ainda expectativa de mudanças também na cadeia de fornecedores, que, acostumada a negociar com a Petrobras, terá de traçar novas relações comerciais. O sócio do escritório Kincaid Mendes Vianna, Godofredo Mendes Vianna, vê a indústria brasileira de bens e serviços numa curva de aprendizado, ao lidar com novas estruturas contratuais. “A posição monopolista da Petrobras gerou muitos litígios nos últimos anos. Tudo o que queriam era alternativa fora da Petrobras para vender seus bens e serviços. Vai ser saudável para o mercado fornecedor”, afirmou.
Levantamento do Valor, com base no plano de negócios da Petrobras e demais empresas, mostra que a parcela de produção de petróleo de outras petroleiras tende a se acentuar nos próximos cinco anos. Só o projeto de Mero (ex-Libra), que receberá quatro plataformas no pré-sal da Bacia de Santos até 2025, aumentará em 432 mil barris/dia a capacidade de produção de terceiros. Embora o projeto seja operado pela estatal brasileira, Shell (20%), Total (20%), CNOOC (10%) e CNPC (10%) detêm, em conjunto, 60% do consórcio.
Além de Mero, outro projeto que contribuirá para o aumento da parcela de produção não-Petrobras é Bacalhau (ex-Carcará), também no pré-sal. A primeira plataforma do campo está prevista para operar em 2024, com capacidade para produzir 220 mil barris diários de petróleo. Esse volume será dividido entre a Equinor (40%), ExxonMobil (40%) e a Petrogal (20%).
Para além dos novos projetos do pré-sal, os desinvestimentos da Petrobras também devem contribuir para a diversificação da indústria de óleo e gás, no Brasil. A companhia está vendendo metade do polo de Marlim, na Bacia de Campos, concessão que passa por um projeto de revitalização e que produzirá a partir de 2023 por meio de duas novas plataformas, que somam 150 mil barris/dia. Isso significa que Marlim pode adicionar, ao novo sócio da petroleira brasileira, uma capacidade de produção de 75 mil barris/dia.
A Petrobras também está saindo da produção em terra e águas rasas (que soma 130 mil barris/dia) e anunciou mais a intenção de vender parte de seus grandes campos maduros na Bacia de Campos – como Albacora e Albacora Leste, que podem contribuir com 70 mil barris/dia para o seu novo operador.
A produção não-Petrobras pode, contudo, ser ainda maior, já que o levantamento não inclui os projetos dos excedentes da cessão onerosa, como Búzios, no qual a Petrobras e os chineses da CNOOC e CNODC ainda não fecharam o acordo de coparticipação que definirá os percentuais de cada um na jazida.