Entidade do setor de petróleo prevê dois anos difíceis

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Fonte: Valor Econômico

O número de profissionais que trabalham em plataformas de óleo e gás e que foram infectados com a covid-19 chegou ontem a 186, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP). Diante da disseminação do coronavírus entre os petroleiros, as empresas se preparam para ampliar testes e evitar contágio maior entre funcionários. Ao mesmo tempo, a presidente do Instituto Brasileiro do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (IBP), Clarissa Lins, afirma que o setor começa a se debruçar sobre o “pós-crise”, para garantir que a indústria esteja pronta para a retomada. Ela acredita que a recuperação se dará de forma “lenta e gradual” e imagina que o mercado terá dificuldade para se equilibrar nos próximos dois anos.
“Quando olhamos pelos próximos dois anos, imaginamos que o mercado não vai conseguir se rebalancear tão rápido, a depender do ritmo da retomada”, disse a executiva ao Valor. “O que estamos começando a trabalhar é qual o padrão de retorno ao trabalho. Temos uma ênfase em preservar atividades operacionais e não criar disrupção ao longo da cadeia.”
Juntas, as principais petroleiras globais que atuam no Brasil – ExxonMobil, Shell, Chevron, Total, BP, Petrobras e Equinor – vão cortar em US$ 32,1 bilhões dos investimentos previstos para este ano no mundo. Para 2021, porém, ainda faltam elementos para projetar o cenário.
Para Clarissa, o momento é de incertezas sobre o timing e o padrão da retomada da indústria brasileira de óleo e gás e sobre em que patamar de preços o petróleo vai se equilibrar. “Dependerá de como o Brasil vai passar por esta crise do ponto de vista sanitário e, depois, do ponto de vista econômico.”
Diante das incertezas do mercado, o governo suspendeu, por ora, os leilões de áreas exploratórias e está revisando o calendário de rodadas para os próximos anos. “A incerteza é tão grande e o padrão da retomada é tão incerto que o adiamento dos leilões foi a decisão mais serena possível”, afirmou ela.
Do ponto de vista da segurança operacional, diante da crise sanitária, a presidente do IBP diz que as medidas de redução do efetivo nas plataformas e o pré-isolamento de petroleiros antes do embarque têm se mostrado “adequados”, mas que o setor mira o aumento das testagens.
“Temos um projeto embrionário para ampliar nossa capacidade [de testagem]”, disse. “O que as práticas internacionais mostram é que, quanto maior a capacidade de teste, maior a segurança do desempenho da atividade”, disse ela.
Já sobre o aspecto econômico e financeiro, Clarissa destaca que o Brasil está inserido na lógica dos mercados globais e, portanto, a indústria de óleo e gás local deve seguir a tendência mundial de cortes de investimentos e de custos.
“Isso se reflete no Brasil no padrão semelhante ao global, que é basicamente o anúncio de cortes de intenção de investimentos e de redução de despesas operacionais. Esse setor terá dispêndios inferiores àqueles inicialmente projetados. O atual nível de preços impõe revisão necessária de todos os projetos em carteira”, afirmou.
Com relação aos acordos de cortes de produção, frente à queda da demanda, a executiva elogiou a postura do Brasil nas rodadas de negociação internacional relativa à sobreoferta mundial de petróleo. “É bom que o Brasil seja visto como um interlocutor e que tenha deixado claro que não assume compromissos de corte de produção. Ficamos confortáveis com o posicionamento, de que não cabe ao Brasil dar a sua contribuição [para o corte]”, disse.
Diante do momento de desequilíbrio “sem precedentes” do mercado e das incertezas sobre o futuro da capacidade de investimentos das petroleiras, a executiva prega a necessidade de que o Brasil mantenha o seu ambiente de negócios competitivo. Ela pede que o arcabouço regulatório seja aperfeiçoado e simplificado, o que inclui a proposta do IBP para que todos os leilões do país sejam feitos sob o regime de concessão.
“O Brasil precisa ser percebido facilmente por todos os investidores como um local competitivo para atrair investimentos de longo prazo em óleo e gás e o fato de termos múltiplos regimes [partilha, concessão e cessão onerosa] não necessariamente ajuda a fazer interlocutores entenderem que temos no Brasil um ganho relativo de competitividade. Competimos com ‘n’ outros lugares [por investimentos]. Quanto mais simples e linear e mais claro e previsível [for o regime], melhor nos posicionamos nessa competição global”, disse a executiva.
Nesse sentido, ela afirmou que os órgãos reguladores têm reagido de “maneira adequada” aos pleitos da indústria, nesse momento de crise, ao ser questionada sobre a decisão da ANP de publicar esta semana um pacote de medidas de flexibilização da regulação das atividades de exploração e produção. O pacote incluiu, por exemplo, a prorrogação da fase de exploração dos contratos das petroleiras por nove meses e a autorização para extensão do prazo no ciclo de auditorias das plataformas.

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