O Mercado Brasileiro de Combustíveis diante da Crise

Comercializada a partir de agosto, nova gasolina brasileira dificulta fraudes e beneficia motoristas
22/06/2020
Linha do BNDES para etanol pode demorar a deslanchar
22/06/2020
Mostrar tudo

Fonte: CBIE

O último trimestre de 2019 indicava uma possível continuidade da dinâmica da oferta e da
demanda em 2020 para o mercado de combustíveis. No entanto, o mundo foi surpreendido
pela pandemia do coronavírus (COVID-19), que levou muitos países a adotarem medidas de
isolamento e distanciamento social como solução para diminuir a velocidade de transmissão
do vírus. A medida impactou severamente a mobilidade, com consequências sobre consumo,
serviços e atividade industrial, reduzindo as expectativas para o crescimento econômico mundial
e trazendo impactos para a demanda de combustíveis e biocombustíveis em todo o planeta. No
Brasil não foi diferente.

A brusca redução na circulação de pessoas, dada a manutenção de atividades apenas nos serviços
essenciais, ocasionaram mudanças nos hábitos. Com as pessoas limitadas as suas residências,
o transporte de passageiros ou a circulação de automóveis praticamente parou, o número de
viagens caiu radicalmente. A movimentação de mercadorias feitas pelo modal rodoviário, por
exemplo, apresentou queda de 45,2% no país, somente entre 13 e 19 de abril, segundo pesquisa
feita pela Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística). Ou seja,
a demanda por combustíveis teve uma diminuição drástica.
De acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP),
as vendas de combustíveis no Brasil, entre janeiro e abril de 2020, tiveram redução de 6,5%
com relação à igual período de 2019. Como é possível verificar no Gráfico 1, o mês de abril
impulsiona a média do quadrimestre com uma queda de 16,7% com relação a março, período
em que o distanciamento e isolamento social foram adotados com maior rigor em grande parte
dos estados da federação. A comparação com igual mês do ano anterior revela uma queda de
23,1%, com a venda caindo de 11,4 milhões de metros cúbicos (m3) para 8,8 milhões de m3.

A análise dos combustíveis de maior participação nas vendas totais, de forma isolada, permite
verificar que, em abril frente ao mesmo período do ano anterior, houve redução no consumo
de óleo diesel B1 (-14,6%), da gasolina C (-28,8%), do etanol hidratado (-33,6%), sendo o QAV
responsável pela maior queda (-84,7%). A menor redução do diesel deve-se à permanência do
deslocamento rodoviário essencial tanto de pessoas quanto de carga. A exceção foi o GLP,
cujas vendas aumentaram 4,1% com relação a abril de 2019, refletindo o respeito das as medidas
isolamento impostas e ficaram em casa, dado que o GLP é amplamente utilizado para cocção
de alimentos no Brasil.

No entanto, ainda há incertezas quanto à variação da demanda desses combustíveis ao longo
de 2020, dependendo dos desdobramentos do quadro da COVID -19 no Brasil. Diante deste
novo cenário, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) editou uma Nota Técnica com a análise
dos impactos da pandemia do COVID-19 no mercado brasileiro de combustíveis. A EPE traçou
três trajetórias para a demanda brasileira de combustíveis entre 2020 e 2022, intituladas Atlas,
Cronos e Prometeu, sendo aplicadas à gasolina C, ao etanol hidratado, ao óleo diesel B, ao QAV
e ao GLP.

A trajetória Atlas considera que a duração do período de distanciamento social será menor (3
meses), com os seus efeitos sendo mitigados em um período relativamente curto. A trajetória
Cronos assume um período de distanciamento social um pouco maior (4 meses), com uma
dinâmica mais lenta na diminuição dos casos de COVD-19 e, portanto, considera um aumento
progressivo da circulação de pessoas, volta das atividades laborais, retorno do comércio e
mudanças parciais de comportamento na sociedade brasileira. Finalmente, a trajetória Prometeu
considera que os desdobramentos da pandemia serão ainda mais impactantes, havendo
a necessidade de afastamento social mais longo (7 meses), com a retomada das atividades
ocorrendo de forma lenta e gradativa.

As diferentes trajetórias apresentadas pela Nota Técnica projetam impactos distintos na
demanda brasileira de combustíveis, considerando as especificidades de cada produto. Segundo
o estudo da EPE, as vendas de óleo diesel B pelas distribuidoras podem variar de 52,9 a 55,9
bilhões de litros em 2020, considerando os resultados das trajetórias de demanda. Ou seja,
uma retração de 8% em relação ao registrado em 2019 na trajetória Prometeu, e uma redução
de 2% na trajetória superior (Atlas), como mostra o Gráfico 2. A trajetória da demanda, a partir
de 2020, é crescente ficando entre 56,3 e 58,7 bilhões de litros no cenário mais pessimista e no
mais otimista, respectivamente.

O consumo dos combustíveis do ciclo Otto (gasolina C e etanol hidratado) é realizado
majoritariamente por veículos leves, cuja atividade está altamente vulnerável aos efeitos da
pandemia da COVID-19. Como mostra Gráfico 3, em 2020, a demanda anual do combustíveis
do ciclo Otto ficará entre 45,2 e 50,1 milhões de m3, conforme indicam as trajetórias Atlas e
Prometeu, podendo recuar entre 8% a 17%. Para 2022, as estimativas variam de 47,6 a 54,7
bilhões de litros de gasolina equivalente, o que representa uma variação de -13% a 0% em
relação a 2019.

A análise separada de cada combustível do ciclo Otto, feita pela EPE, estima que a demanda
nacional de etanol hidratado deverá ser menos impactada que a da gasolina C até 2022.
Apesar da considerável queda na comercialização do etanol hidratado nos postos de revenda
observada nos meses de março e abril de 2020. Essa redução das vendas foi intensificada pela diminuição do preço da gasolina, em razão da significativa queda do preço do barril de petróleo
no mercado internacional, e, consequentemente, do etanol. Portanto, espera-se que o etanol
hidratado tenha uma recuperação superior à gasolina C até 2022, apesar de ainda inferiores aos
patamares de 2019.

Na contramão do ocorrido para os demais combustíveis, as vendas do GLP cresceram em
função do uso nas residências para cocção de alimentos. O temor provocado pela pandemia
nos dias iniciais levou parte da população a antecipar as suas compras e a estocar botijões
de GLP, aumentando ainda mais as vendas do produto. Com base no exposto, as estimativas
obtidas nas trajetórias de demanda da nota técnica indicam que as vendas de GLP crescerão de
2% a 3% em 2020, podendo ficar em 13,5 milhões de m3 ou atingir a demanda máxima de 13,7
milhões de m3.

Devido à redução expressiva da quantidade de voos nacionais e internacionais, projeta-se uma
retração de 34% a 60% no consumo de QAV em 2020. Espera-se que o retorno da demanda
por QAV aos patamares de 2019 se dê em 2022, na trajetória Atlas presente no Gráfico 5. Na
trajetória Prometeu, estima-se que o consumo de QAV será inferior aos volumes de 2019 ao
longo de todo intervalo considerado, com a demanda em 2022 correspondendo a cerca de 80%
do observado em 2019 (5,5 bilhões de litros).

Diante das projeções de demanda realizadas pela EPE, espera-se mudanças para adaptação
da oferta nacional de derivados. A redução do consumo, inicialmente observada na revenda,
é transmitida ao longo da cadeia, afetando distribuidoras, transportadoras, importadores e
refinarias. A diminuição expressiva dos volumes comercializados de combustíveis na distribuição
e revenda implica na perda de receitas, elevação momentânea dos estoques nos dois elos da
cadeia, e a necessidade de adaptação da atividade para minimização dos custos operacionais.
No refino, a redução da demanda nacional por derivados de petróleo, também, incorre em
elevação considerável dos estoques e alterações dos fluxos logísticos. Além disso, as refinarias
nacionais podem ser levadas a realizar mudanças relevantes nas suas estratégias de negócio, de
acordo com o andamento das medidas de distanciamento e isolamento social, e das condições
do mercado nacional e internacional de combustíveis.

Portanto, pelo lado da oferta, é esperado um fator de utilização do parque de refino variando
de 68% a 72% em 2020, e retornando ao patamar dos últimos anos (de 70% a 80%) entre 2021
e 2022. Estima-se que as refinarias modificarão o perfil de produção.

 

Matéria completa com gráficos: https://drive.google.com/file/d/14yqOUEEcvNeE-2CgK-jHh2gZhuj1nKCT/view

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *