Valor Econômico
As petroleiras independentes PetroRecôncavo e 3R Petroleum são as mais afetadas pela decisão da Petrobras de suspender os processos de vendas de ativos, dizem analistas consultados pelo Valor. Outras companhias de exploração e produção de petróleo e gás listadas na bolsa brasileira nesse setor também sentiram impactos da decisão, embora em menor escala.
A estatal interrompeu no dia 1º de março os desinvestimentos em andamento por 90 dias a pedido do Ministério de Minas e Energia (MME), para uma reavaliação da política energética. O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, é crítico da venda de ativos. O programa está em andamento desde 2015, com objetivo de tornar o portfólio mais enxuto e focado em projetos de exploração e produção em águas profundas.
Cálculos do Valor Data mostram que as ações da 3R caíram 25,3% desde o dia 28 de fevereiro, antes da interrupção das negociações dos ativos da estatal, até o fechamento do mercado na quinta-feira (16). Os papéis da PetroRecôncavo tiveram variação negativa de 26,75%% nesse período. Para a Prio, a queda foi de 5,93%, enquanto no caso da Enauta ficou em 18,29%.
Luiz Carvalho, analista do UBS BB, diz que as ações das empresas de petróleo independentes brasileiras têm refletido não apenas a suspensão das vendas, como também questões globais, como a queda do preço do barril de petróleo no mercado internacional e os temores de recessão. Carvalho lembra ainda que, na mesma semana da interrupção dos desinvestimentos, o governo anunciou um novo imposto sobre as exportações de petróleo bruto, de 9,2%, que terá duração de quatro meses, o que também impacta os papéis, sobretudo no caso da Prio.
Para o analista, a soma dos cenários externo e interno trouxe uma percepção maior de risco aos investidores: “Houve uma deterioração do ambiente macro, que não foi exclusivo das empresas no Brasil, mas o país também teve uma agenda negativa nas últimas semanas”, diz.
Uma das companhias mais impactadas pela interrupção das vendas da Petrobras foi a 3R, que havia assinado o contrato de compra do Polo Potiguar em janeiro de 2022, e aguardava o cumprimento de condições precedentes para a conclusão. A venda do polo, assinada por US$ 1,38 bilhão, tem potencial para aumentar as reservas de petróleo e gás da 3R em aproximadamente 40%, segundo cálculos da Empiricus. O Polo Potiguar inclui ainda a Refinaria Clara Camarão, de pequeno porte, além de um parque de tancagem, o que marca a entrada da 3R nesses negócios.
Na semana passada, em teleconferência com analistas, no entanto, executivos da empresa reforçaram a crença no fechamento do negócio. O diretor financeiro da 3R, Rodrigo Pizarro, afirmou acreditar que a expectativa é que a conclusão ocorra ao fim do atual trimestre ou no início do próximo. “Não temos qualquer evidência de que a Petrobras não está cumprindo [o contrato]”, disse o executivo.
No caso da PetroRecôncavo, estava em andamento a negociação, em parceria com a Eneva, da compra do Polo Bahia Terra, um dos maiores ativos terrestres do processo de desinvestimentos. Com 28 concessões e infraestrutura associada localizadas nas Bacias do Recôncavo e Tucano, o ativo poderia ampliar as reservas da PetroRecôncavo em 87%. O negócio, entretanto, ainda não estava em fase vinculante.
No domingo, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, divulgou postagem em redes sociais em que afirmou que a estatal vai continuar com as atividades na Bahia: “Já anunciamos a revisão e suspensão das transferências compulsórias e vamos seguir em diálogo direto com todos e todas para construir uma Petrobras forte para o futuro do povo brasileiro”, escreveu.
Larissa Quaresma, analista da Empiricus, diz que é menos provável que a venda do Polo Bahia Terra siga adiante, pela falta de um contrato vinculante e pela importância política da Bahia para o governo. Na visão dela, o cenário é diferente do caso do Polo Potiguar, que já recebeu a própria aprovação interna da Petrobras, com o aval do conselho de administração da estatal, antes da suspensão. Quaresma concorda que os riscos nesse setor aumentaram e lembra ainda que o crescimento do portfólio das petroleiras independentes deve ser menos célere caso a Petrobras não prossiga com novas vendas.
Carvalho, do UBS, afirma que as vendas ajudaram a tornar a produção nacional mais plural e a aumentar investimentos em áreas que recebiam menos atenção da estatal: “A capacidade de investimento e o foco nos campos que foram desinvestidos ficou muito maior. Quanto mais plural e diversificada a indústria, melhor”, diz.
Na semana passada, a Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo e Gás (Abpip) divulgou carta pública em que pede ao governo que a suspensão afete apenas as negociações em fase inicial e que os desinvestimentos sejam retomados após a interrupção, sobretudo em campos em terra e em águas rasas: “Entendemos ser urgente esclarecer que a anunciada suspensão dos desinvestimentos, ainda que de caráter precário, traz efeitos nefastos que precisam ser afastados com urgência”, diz a carta, assinada também por outras entidades.