O que fazer com os preços dos combustíveis

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Valor Econômico / Opinião

Nos últimos dias, assistimos mais um episódio da dificuldade de lidar com preços dos combustíveis em contexto altista. Assim como em 2018, o presidente da Petrobras, fiador da política de paridade internacional de curto prazo, perdeu seu posto.

O preço da gasolina nos Estados Unidos (Gulf Coast Conventional Gasoline Regular Spot Price), principal referência internacional, subiu 83% desde o início de novembro. Por sua vez, o preço para gasolina da Petrobras para entrega em Duque de Caxias subiu 77%.

Deve-se preservar a lógica do preço de mercado competitivo para evitar poder de mercado de qualquer agente

Há três problemas econômicos relacionados ao preço dos combustíveis no Brasil. O primeiro problema é volatilidade dos preços internacionais dos derivados, que se soma à volatilidade da taxa de câmbio no Brasil. O segundo problema é o nível dos preços. O terceiro problema é o repasse dos preços das cadeias produtivas. A questão do repasse é sensível na atividade de frete, onde a sobreoferta dificulta o repasse integral das variações do preço do diesel, causando insatisfação dos caminhoneiros.

Esses três problemas têm consequências econômicas e políticas significativas. Em nossa opinião, estes problemas podem e devem ser enfrentados com políticas e instrumentos adequados, já utilizados na experiência internacional. Ao mesmo tempo, é fundamental manter o alinhamento dos preços domésticos ao mercado internacional sob pena de criar graves distorções no consumo de energia e na indústria de petróleo nacional.

A transmissão da volatilidade internacional em preços tão relevantes em termos sociais e econômicos, como diesel, GLP e gasolina, pode induzir decisões não eficiente de consumo e de investimento. A experiência internacional indica mecanismos para atenuar a volatilidade como impostos flexíveis e fundos de estabilização. A previsibilidade é importante na tomada de decisões de consumo e investimento produtivo.

A mudança na forma de cobrança dos impostos, principalmente ICMS, através de taxa fixa sobre a quantidade (R$/litro), conforme a proposta do governo federal, ajudaria a mitigar a volatilidade. Na forma ad valorem atual, o tributo é um propagador da volatilidade. Com base na projeção de preços, a taxa poderia ser definida anualmente. É importante destacar que essa questão, se separada da unificação de alíquotas e de seus níveis, pode ser atacada sem implicações fiscais para os Estados. A previsibilidade fiscal deveria ser benéfica à continuidade de políticas públicas dos Estados.

Os impostos federais (PIS/Cofins e Cide) podem ser unificados em um único imposto específico flutuante. O valor deste imposto poderia ser determinado através de uma fórmula que buscasse amortecer a volatilidade do preço dos derivados na refinaria. Cabe ressaltar que quando os preços do petróleo sobem, o governo federal aumenta sua arrecadação via royalties, participações especiais e óleo lucro do governo nos contratos de partilha.

Desta forma, seria possível reduzir o valor do imposto federal específico para mitigar o impacto nas bombas, sem perda de arrecadação pelo governo federal. Da mesma forma, a fórmula reajustaria o valor do imposto no cenário de queda dos preços nas refinarias.

A questão do repasse de preços pode gerar perdas de bem estar ao longo da cadeia. As perdas estão relacionadas às imperfeições de mercado nas etapas de produção. No caso do diesel, o repasse de alterações de seu preço para o frete é dificultado pelo excesso de oferta nessa última atividade. O tabelamento do frete, como qualquer piso de preços, é uma medida que tende a gerar distorções alocativas e seu monitoramento é inviável. Soluções específicas para proteger a renda dos caminhoneiros, que apresentem menores custos sociais do que o controle de preços, devem ser buscadas pelo governo, como ajuda à reconversão no mercado de trabalho e o refinanciamento das dívidas.

Em nosso entendimento, as ações de coordenação no mercado de combustíveis não devem descolar os preços domésticos dos preços do mercado internacional. Subsídios aos combustíveis fósseis vão na contramão da descarbonização da matriz energética. Os instrumentos fiscais devem funcionar para estimular a transição energética. O arcabouço institucional brasileiro, com upstream e downstream liberalizados, não é compatível com administração de preços.

Utilizar a Petrobras para segurar preços tem consequências desastrosas, como o período 2011 a 2014 demonstrou. A experiência do diesel em 2018 mostrou que utilizar recursos fiscais para esse fim é extremamente custoso para a sociedade em contexto de restrição orçamentária, e ineficaz.

Por fim, a busca de uma política sustentável para os preços de combustíveis no país deve fazer princípios e objetivos de longo prazo para o setor que são: i) a promoção da concorrência e da transparência de preços no mercado; ii) a busca da simplificação, racionalização e otimização tributária para reduzir não apenas a volatilidade, mas também as fraudes e sonegação; iii) o combate ao roubo de combustíveis e práticas ilegais que distorcem a concorrência setorial; e iv) a descarbonização do setor através da diversificação da matriz do setor de transporte com gás natural, biocombustíveis e eletrificação da frota.

O debate político e regulatório deve ser orientado para formas de promover a efetiva competição no mercado de combustíveis. Deve-se preservar a lógica do preço de mercado competitivo de paridade de importação e os custos de internação dos derivados, no caso de importação. Com isso, seria evitado o poder de mercado por qualquer agente relevante e, por outro, estaria garantida aos novos investidores a segurança institucional de que haverá a prática de preços de mercado competitivos no ambiente de negócios brasileiro

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