Redução do biodiesel ao diesel provoca efeito cascata

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Globo Rural

Tornou-se popular o dito de que “o bater de asas de uma borboleta no Brasil poderia causar um tornado no Texas”. O chamado “efeito borboleta” é uma premissa estudada na meteorologia e associada à teoria do caos. A ideia central desse pensamento é de que alterações simples em sistemas complexos podem levar a consequências incalculáveis e imprevisíveis.
Essa associação se aplica bem às recentes mudanças na política de biodiesel no Brasil. Há algumas semanas, a União reduziu o percentual de mistura do biodiesel no diesel, que passou de 13% para 10%. Embora pareça pequena, essa alteração tem um impacto de enormes proporções não apenas para o setor dos biocombustíveis, mas para diversas áreas de nossas vidas.
A começar pelo fato de que o biodiesel está no centro de uma cadeia produtiva que emprega mais de 1,5 milhão de pessoas no Brasil: são agricultores familiares, produtores rurais, agroindústrias de extração de óleo vegetal, indústrias de insumos químicos, entre outros. O biocombustível é obtido em 50 parques instalados em 43 municípios de todas as regiões.

Esse setor gerou amplo desenvolvimento econômico, com mais de R$ 9 bilhões investidos no país. Além de trazer empregos e renda, também coloca o Brasil numa posição privilegiada na agenda sustentável: o biodiesel reduz em cerca de 80% as emissões de gases de efeito estufa em relação ao diesel fóssil, sendo fator essencial para o país cumprir as metas do Acordo de Paris.
E mais: desde 2008, diminuiu em 47 bilhões de litros a importação do combustível não renovável, substituído por uma fonte de energia ambientalmente segura.
É esse patrimônio que está em jogo com a redução da mistura. Estudos do setor mostram que a medida pode ter impacto severo na economia, com perdas de até R$ 24 bilhões e o fechamento de até 170 mil postos de trabalho. Para nosso PIB, haveria uma redução de R$ 8 bilhões. Um cenário aterrador, ainda mais considerando as graves dificuldades que já enfrentamos em virtude da pandemia.
Não é só isso: a queda na produção do biodiesel diminui a oferta de farelo de soja no mercado interno. Consequentemente, há maior custo para o setor de proteína animal, que utiliza esse insumo para a ração dos rebanhos. Os preços de carnes, ovos e produtos lácteos, já elevados, terão mais aumentos, prejudicando sobremaneira o custo de vida das famílias.

Com mais diesel na mistura dos combustíveis, há também maior emissão de poluentes. Um estudo da Empresa de Pesquisa Energética mostrou que, sem o uso do biodiesel, a concentração de partículas na atmosfera da metrópole de São Paulo seria 4,8% superior ao registrado em 2018. Ou seja: cresce também o prejuízo à nossa saúde, especialmente ao sistema respiratório, no momento em que enfrentamos a Covid-19.
Não foi por acaso que se construiu esse patrimônio. Montadoras e transportadores se unem contra mistura de biodiesel no diesel esforços de empreendedores, pesquisadores e autoridades, o Brasil desenvolveu uma cadeia altamente qualificada, tornando-se líder global na matéria de biocombustíveis. Isso demonstra como é possível conciliar crescimento econômico com sustentabilidade, apontando os caminhos para um futuro melhor para todos.
Uma simples decisão da União está provocando um tornado devastador não apenas para o setor, mas para a economia, a saúde e a vida de todos. Ainda há tempo de corrigir esse rumo, evitando prejuízos muito maiores, sobretudo nesse momento tão difícil que atravessamos. Preservar a força do biodiesel é essencial para o Brasil trilhar um caminho seguro no rumo do desenvolvimento.
*Francisco Turra é presidente do Conselho de Administração da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), do Conselho Consultivo da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e ex-ministro da Agricultura

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