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Fonte: Valor Online

Não mereceram a atenção devida as projeções feitas, no final do ano passado, pelo diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Décio Oddone, sobre a evolução futura da indústria do petróleo no Brasil. Se em 2018 a receita da União, Estados e municípios com royalties do petróleo, participações especiais, bônus de assinatura e óleo-lucro ficou em R$ 60 bilhões, Oddone estima que ela subirá para R$ 300 bilhões em 2030. Atenção: este valor será por ano, a partir de então!
Só como referência, vale observar que a quantia é superior à arrecadação do Tesouro com a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) no ano passado. Isto significa que a receita com o petróleo será uma das principais do setor público brasileiro na próxima década.
Em conversa com o Valor, o diretor-geral da ANP destacou um elemento a mais das projeções: o montante subirá para R$ 400 bilhões se também for considerado o pagamento de Imposto de Renda das empresas do setor de petróleo em 2030.

Receita do petróleo pode tirar urgência das reformas
Ficou faltando incorporar no cálculo o pagamento pelas empresas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), do PIS/Cofins e da Cide sobre combustíveis. Em 2017, a Petrobras pagou R$ 35 bilhões só de ICMS, de acordo com o balanço da empresa.
As projeções da ANP foram feitas considerando que a produção de petróleo bruto do país passará dos atuais 2,5 milhões de barris por dia para 7,5 milhões de barris por dia em 2030. Atualmente existem 107 plataformas em operação no Brasil. Elas subirão para 170, estimou Oddone. As exportações brasileiras de petróleo bruto podem sair de 1 milhão para 4 milhões de barris no período. "A indústria do petróleo no Brasil vai mudar de patamar", ressaltou o diretor-geral da ANP. E isso vai ocorrer em pouco tempo.
É impressionante observar que, de 2016 a 2018, cem leilões de petróleo foram realizados em 82 países, envolvendo a contratação de 3 mil blocos. De acordo com dados da Wood Mackenzie, US$ 9 bilhões foram arrecadados com bônus de assinatura em todos os leilões, sendo US$ 7 bilhões no Brasil - ou seja, 75% de todos os bônus de assinatura foram pagos aqui.

A ANP estimou a produção futura de petróleo com base nos leilões já realizados e nos leilões da 6ª Rodada do Pré-Sal e da 16ª Rodada de licitação de áreas do pós-sal, que serão feitos neste ano. O cálculo considerou também os leilões do óleo excedente dos seis blocos cedidos em 2010 à Petrobras. Somente com o leilão do excedente da cessão onerosa, o governo estima arrecadar R$ 125 bilhões com o bônus de assinatura. Todos os números são impressionantes.

O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) já autorizou a ANP realizar estudos para a 7ª e 8ª Rodadas do pré-sal em 2020 e 2021. Estas, no entanto, não foram incorporadas às projeções da ANP. Ou seja, elas poderão tornar os R$ 300 bilhões em 2030 um valor subestimado. Em suas projeções, a ANP considerou um preço médio de US$ 70 para o barril de petróleo no período. Ontem, o petróleo Brent fechou em US$ 61,40.

Há um dado que merece ser destacado: a receita da União subirá mais do que a de Estados e municípios porque, no caso do regime de partilha de produção, ela fica com uma parcela do petróleo extraído, o que veio a ser chamado de "óleo-lucro". A União vende sua parte e fica com a receita.
Há duas maneiras de encarar a nova realidade, embora elas não sejam excludentes. A primeira é com grande alegria, pois a exploração do pré-sal vai proporcionar uma renda considerável aos brasileiros, que poderá melhorar a vida de todos e colocar o país entre as grandes economias do mundo.
A segunda visão é de preocupação, pois a montanha de dinheiro que ingressará nos cofres públicos poderá inibir a vontade do Congresso Nacional, que já é bastante fraca, de fazer as reformas necessárias para ajustar as contas públicas e colocar o país novamente na trilha do desenvolvimento sustentado. Ou seja, o petróleo poderá se tornar uma "maldição".

O setor público brasileiro está quebrado, em todas as suas dimensões. Registra déficit primário desde 2014 (ou seja, as despesas são maiores do que as receitas, sem considerar o pagamento de juros) e a situação deverá perdurar, no mínimo, até 2021. As despesas obrigatórias crescem sem parar, o sistema tributário é um caos e o sistema previdenciário é uma máquina de produzir desigualdades, como bem lembrou o ministro da Economia, Paulo Guedes.
As reformas trabalhista, previdenciária e tributária são essenciais para reorganizar o Estado em bases mais sólidas e justas, melhorando o ambiente para os negócios e para a retomada da economia e do emprego. A população brasileira está envelhecendo rapidamente e não é possível manter um sistema em que, nos Estados, os servidores se aposentam, em média, com 49 anos de idade.

O sistema tributário precisa ser modernizado e simplificado. A alíquota do Imposto de Renda pago pelas empresas no Brasil é uma das mais elevadas entre os países do G-20. Os tributos são regressivos e se acumulam ao longo da cadeia produtiva, em um emaranhado de obrigações que tornam a vida do contribuinte um verdadeiro inferno. Os tributos que incidem na contratação de mão de obra colocam uma massa de trabalhadores na informalidade, sem qualquer proteção.
A necessidade de realizar as reformas não pode ser obscurecida pela perspectiva de ganhos extraordinários com o petróleo. Será um lesa-pátria usar a receita futura do petróleo para manter uma situação de privilégios e injustiças e um Estado obsoleto. Principalmente porque a receita do petróleo é finita. Em um prazo não muito distante, ele acabará ou será substituído por fontes alternativas de energia.

Não se pode esquecer o que ocorreu recentemente com o Rio de Janeiro, o Estado que mais recebe royalties do petróleo. Bastou que a cotação do petróleo despencasse, o que provocou uma redução considerável da receita com royalties e participações especiais, para o governo estadual entrar em colapso. É claro que houve também as roubalheiras.

O dinheiro que será arrecadado com a exploração do pré-sal - uma dádiva da natureza ao Brasil - precisa ser direcionado a investimentos em educação, cultura, saúde e segurança para tornar melhor a vida de todos os brasileiros. O atual governo deve agir rapidamente para produzir e apresentar as necessárias reformas do Estado. Por isso, é preciso dizer: corra, Bolsonaro, corra! Quanto mais tempo as reformas demorarem, mais difícil será aprová-las.

Ribamar Oliveira é repórter especial e escreve às quintas-feiras

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