Mesmo com ameaça de Trump, Brasil deve taxar etanol americano no fim do mês

Por que a volta de tarifas ao etanol importado pode fazer Trump retaliar o Brasil?
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O Globo

Apesar das ameaças do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o governo brasileiro deve restabelecer, a partir do fim do mês, a tarifa de importação de 20% sobre o combustível vindo do segundo maior parceiro comercial do país. Na noite de segunda-feira, Trump deu a entender, quando indagado por jornalistas, que poderia retaliar o Brasil caso o etanol americano voltasse a ser taxado:

— Nós não queremos ninguém nos tarifando, embora eu tenha uma relação muito boa com o presidente (Jair) Bolsonaro. No que se refere ao Brasil, se eles impõem tarifas, nós temos de ter uma equalização de tarifas. Vamos apresentar algo que tenha a ver com tarifas, e com justiça. Porque muitos países, por muitos anos, têm nos cobrado tarifas para fazer negócios, e nós não cobramos deles. E isso se chama reciprocidade, se chama tarifas recíprocas, e talvez você veja algo sobre isso muito em breve.

O governo brasileiro concedeu, no ano passado, isenção no pagamento dessa taxa para até 750 milhões de litros de etanol vindo dos EUA. O benefício vale até 31 de agosto. Os produtores brasileiros alegam que os Estados Unidos, apesar de terem sido beneficiados com a tarifa zero, não concederam qualquer contrapartida em relação ao que é aplicado sobre o açúcar brasileiro, que chega a ter uma tarifa próxima de 140%.

País amigo

De janeiro a abril deste ano, o Brasil importou 741,6 milhões de litros de etanol, dos quais 663,7 milhões dos EUA. Os produtores americanos, por sua vez, pressionam para que a tarifa zero seja mantida e ampliada, acabando com a cota de isenção para 750 milhões de litros.

De 2010 a 2016, o Brasil incluiu o etanol na Lista de Exceções da Tarifa Externa Comum (Letec) do Mercosul, composta por cem produtos, isentando o combustível de tarifas. A partir de 2017, por conta do grande volume de importações, o governo brasileiro passou a limitar a aplicação da tarifa zero para as importações de até 600 milhões de litros por ano.

Em agosto do ano passado, esse limite foi ampliado para 750 milhões de litros.

O presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Evandro Gussi, diz que, se o governo ceder às pressões americanas, o prejuízo para os brasileiros seria grave. Segundo ele, os produtores já acumulam perdas por causa da queda do consumo no mercado interno, em função da pandemia do novo coronavírus.

— Pela fala do presidente Trump, percebe-se que ele não conhece o tema. Ele fala como se nós fossemos estabelecer uma tarifa contra os Estados Unidos, e a tarifa foi estabelecida em 1995, no âmbito do Mercosul.

A pressão vinda da Casa Branca tem como pano de fundo as eleições americanas em novembro. As empresas petrolíferas dos EUA pressionaram muito o governo para não permitir que se aumentasse a adição do etanol de 10% para 11% na gasolina, o que resolveria o problema dos elevados estoques de etanol do país.

Relações diplomáticas

O presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Nelsinho Trad (PSD-MS), disse que vai discutir o assunto com o Itamaraty na semana que vem, mas defendeu os interesses nacionais na disputa.

— Acho que a gente tem que focar nossas relações diplomáticas com os Estados Unidos no sentido de restabelecer o que foi retirado dos produtores brasileiros — disse o senador.

Ele acrescentou, contudo, que o governo brasileiro avalia que todas as ações de Trump têm um viés político para garantir apoio do eleitorado americano e que as promessas e ameaças do dirigente dos EUA, que tentará se reeleger agora em novembro, podem não se concretizar.

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