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Fonte: Folha de S.Paulo / Opinião

João Santana

Influenciados pela greve dos caminhoneiros e o consequente questionamento sobre a prática de preços da Petrobras, aqui e ali aparecem novos defensores não da privatização, mas, como dizem, do “entorno” da empresa.
Esse “entorno” são justamente as refinarias, rede de distribuição, transporte e outras “partes” da companhia. Alguns teorizam e dizem que a Petrobras deve ficar apenas com a área de produção, em que é muito boa, mas deve abrir mão das outras.
Tratam como se o fenômeno econômico do monopólio que a Petrobras exerce no refino, além de outras áreas, fosse em virtude da lei. Esquecem que, desde 1997, o Estado não mais detém o monopólio do negócio do petróleo; no que toca ao refino, quem se interessar pode explorá-lo mediante simples autorização da Agência Nacional do Petróleo, algo mais fácil do que abrir uma nova concessionária de ônibus em São Paulo.
Após 1997 sobrou ao Estado apenas o controle da Petrobras, que tem natureza jurídica privada, com ações em Bolsa e milhares de acionistas.
Se pensássemos em sua privatização, esta se daria pela venda da fatia de 50,26% das ações ordinárias que o Tesouro Nacional detém, que representam cerca de 28% do total das ações da Petrobras, e pela eventual venda do percentual do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Lembremos que, como empresa globalizada, boa parte das ADRs (American Depositary Receipts) comercializadas nas bolsas internacionais está nas mãos de investidores estrangeiros, que aliás já abocanharam uma boa verba indenizatória relativamente aos desmandos da Operação Lava Jato.
É fato que no “novo mercado”, novas empresas ou as que migraram obrigam-se a uma governança com mais transparência ao investidor e com uma única classe de ação representativa do capital.
A Petrobras inclusive já aderiu ao Nível 2 de governança na B3 –que, embora tenha concedido a isenção do direito de voto das ações preferenciais em situações decisivas ou críticas, teve ampliadas as atribuições do Comitê de Minoritários da companhia, além da exigência de 40% de conselheiros independentes na composição de seu Conselho de Administração.
Assim, caso o Estado queira se desfazer das “suas” refinarias, deverá combinar com os beques, que no caso são os acionistas privados, os sócios do Estado que podem e têm todo o direito de não aceitarem a venda das refinarias, além de outros ativos estratégicos. Mesmo que eventualmente o majoritário alegue que restará uma empresa menor, especializada e no primeiro momento menos endividada. Se forçados, pleitearão indenizações milionárias.
Além disso o jogo terá a CVM como juiz, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) como auxiliar e os controles da B3 como árbitros de vídeos.
Podem os mais fazendários dizer que exercerão a maioria na assembleia e com isso aprovarão o que quiserem, vendendo o que bem entenderem, sem a intervenção dos árbitros. Isso até poderá acontecer, porém não sem antes muita água rolar por debaixo da ponte, levando investidores e governo a arbitragens, recursos, agravos e demais medidas que nosso direito processual faculta aos montes.
Já se pode vislumbrar a contenda. De um lado, os ilustrados agentes do Estado a mostrar que, sem a venda das “partes”, continuará o monopólio e, sem o dinheiro resultante, não se aplacará o déficit público; além disso, restará uma nova Petrobras no final, mais forte e sem dívidas.
Do outro estarão os “minoritários”, mas não tanto, que dirão que suas ações representam o todo da empresa, que o controlador exerce abuso de controle e obriga perdas econômicas, e que compraram seus papéis segundo as regras de mercado e que essas nada falavam em partição da empresa.
Melhor seria para todos que abandonássemos essa idiossincrasia getulista e privatizássemos de vez a Petrobras, que cada vez mais terá menos sentido para o Estado –e, acreditem, sob seu controle valerá no futuro menos do que hoje.
João Santana
Advogado e ex-ministro da Infraestrutura (mai.1991-abr.1992, governo Collor)

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