Reajuste da Petrobras ocorre em meio a queixas de distribuidoras por falta de diesel

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Valor Econômico

Em meio à desconfiança do mercado em relação à política de preços da Petrobras, nas últimas semanas, a estatal anunciou na quinta-feira (18) um reajuste de 15% para o diesel, o maior aumento da companhia para o derivado desde o início de 2019, quando o presidente Roberto Castello Branco assumiu a petroleira.
A alta ocorre em meio à expectativa de crescimento da demanda nas próximas semanas e a queixas de distribuidoras de que a estatal não tem dado conta de atender, integralmente, às encomendas de clientes.
Na avaliação do líder da área de petróleo da consultoria Stonex, Thadeu Silva, ao se aproximar mais da paridade de preços de importação (PPI), embora a estatal ainda mantenha descontos em relação à referência internacional, a petroleira dá um sinal positivo ao mercado, num momento em que ela própria enfrenta dificuldades para suprir a demanda.
“Esse reajuste [de 15%] foi sendo gestado ao longo dos últimos meses. Vínhamos tendo reajustes incompletos desde novembro, deixando a defasagem entrar. E, agora, quando chegamos à beira de março, com a safra agrícola crescendo e consumo do diesel com tendência de aumentar bastante nas próximas semanas, o mercado está muito mal suprido. A Petrobras teve que fazer o aumento, se não poderíamos entrar ou numa crise de abastecimento ou ela [Petrobras] teria que incorrer em muito prejuízo, tendo que importar muito diesel e vender abaixo [da paridade de importação] aqui no Brasil”, comenta Silva.
Segundo ele, a Petrobras se aproximou do preço de paridade de importação. De acordo com as estimativas da Stonex, ainda há espaço para um “leve reajuste”, de R$ 0,05 no litro do diesel. “Acredito que, em relação à cotação de ontem [referência para decisão do reajuste], a Petrobras está praticamente no zero a zero”, disse.

Carta à ANP
Na semana passada, a Federação Nacional de Distribuidores de Combustíveis (Brasilcom), que representa as distribuidoras regionais, encaminhou uma carta à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) alertando para riscos de desabastecimento no mercado. No documento, a Brasilcom relata que a Petrobras vem reportando, às distribuidoras, cortes na entrega de produtos pedidos para março, em diversos polos de suprimento.
Segundo duas fontes, embora a petroleira esteja respeitando os compromissos previstos em contrato com os clientes, as distribuidoras estão tendo dificuldades para encomendas cargas adicionais – no mercado, em geral, distribuidoras costumam contratar uma parte da sua demanda com a Petrobras e deixar uma “folga” para negociar com importadores em condições de preços melhores.
As empresas reclamam que os preços praticados pela petroleira vinham afastando importadores e que, ao mesmo tempo, a estatal brasileira não vinha dando conta de atender à demanda das distribuidoras.
No documento enviado à ANP, a Brasilcom também destaca que a Petrobras deixou para comunicar os agentes do mercado sobre os cortes na entrega num “prazo exíguo” que resultará “na quase impossibilidade de se obter contratos de importação em quantidade suficiente”.
A agência reguladora, por sua vez, respondeu à carta, pedindo mais informações sobre os casos narrados pela federação, sob a justificativa de que se trata de um requerimento “genérico”.
O presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araújo, conta que depois de meses com dificuldades de trazer cargas para o país, as importadoras associadas já têm sido procuradas pelas distribuidoras, interessadas em contratar novos volumes. Ele lembra, porém, que a Petrobras ainda trabalha com uma defasagem de cerca de R$ 0,10 para o litro do diesel.
“As importadoras têm condições de atender ao volume complementar demandado pelas distribuidoras, mas a preços de mercado, não aos preços da Petrobras”, comentou.
A Petrobras esclareceu que está atendendo à demanda por diesel das distribuidoras, dentro dos compromissos assumidos em contrato.
“A Petrobras comunicou a sua disponibilidade de atendimento de óleo diesel para o mês de março dentro dos prazos e volumes estabelecidos nos contratos com as distribuidoras. Os volumes aceitos para março estão muito acima da média de vendas dos últimos meses e em conformidade com a sistemática prevista nos contratos e nos normativos da ANP [Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis]”, comentou a estatal, em nota.

Reajuste-surpresa
Segundo dois executivos do setor, o reajuste da Petrobras surpreendeu, num sinal de que a estatal procura dar uma resposta aos investidores, após a repercussão negativa na bolsa à política de preços da companhia.
O mercado reagiu positivamente ao anúncio do reajuste. O Goldman Sachs destacou que, com o aumento anunciado, a estatal atinge o menor nível de desconto em relação ao PPI desde o início do ano para o diesel. O banco estima, porém, que a petroleira brasileira continua a trabalhar com defasagens de 8% para o diesel e de 11% para a gasolina. A XP Investimentos, por sua vez, estima que a Petrobras ainda opera com uma defasagem de 7% para o derivado.
O reajuste de R$ 0,33 no litro do diesel se dá em meio a questionamentos no mercado sobre a estratégia da Petrobras de segurar reajustes, para conter os efeitos da volatilidade do preço internacional, e de que a companhia poderia ter dificuldades para fazer reajustes elevados quando necessário.
O analista da XP, Gabriel Francisco, vê como “positivo, mas não extraordinário” o aumento anunciado. “O reajuste teve que ser dessa magnitude porque ficou muito tempo sem praticá-los… Ela não está fazendo algo extraordinário, [a paridade] é algo necessário, mas não suficiente, para se investir na Petrobras”, disse. “Foi positivo, mas não é nenhum favor. Esta [paridade de preços] é uma discussão que já estava mais madura. Era um não assunto há quatro meses atrás, mas voltou a ser um assunto. Petrobras não tem que dar resposta a mercado, ela tem que praticar paridade como companhia”, comentou.

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